NATAL BRANCO (1954)
São muitos os chamados “filmes de
Natal”, mas este é, seguramente, um dos mais conhecidos e celebrados. Mas, aparentemente
nada faria prever o prolongado sucesso de “White Christmas”, dado que o filme
nunca parece ultrapassar o nível de uma xaroposa história melodramática, com
uns pozinhos de patriotice barata, umas quantas canções e números musicais e um
“happy end” que nunca esteve em causa desde início, dada a previsibilidade das
peripécias. Acontece que é tudo assim, tal como fica descrito, mas também não é
bem assim. Não se trata de umas canções quaisquer, mas de obras com a
assinatura de alguns mestres neste campo, nomeadamente Irving Berlin, de quem
se ouve um tema que é dos mais populares de toda a história da música norte-americana,
precisamente “White Christmas” que dá o título ao filme, e que desde 1942 se
impunha como uma das canções anualmente mais tocadas em todo o mundo. Pode
mesmo considerar-se “White Christmas” a canção de Natal por excelência.
A banda sonora é, portanto, magnífica,
o que por si só constitui um trunfo. Enorme. Depois, há que acrescentar o
elenco. Bing Crosby foi o cantor que contabilizou até hoje mais “royalties”
interpretando “White Christmas” (cerca de 50% do total facturado pela canção),
identificando-se por completo com este tema, e a seu lado surge um outro actor
que nos anos 50 era uma vedeta em pleno, Danny Kaye.
Deve dizer-se, aliás, que Danny
Kaye não foi a primeira escolha para este filme, Fred Astaire era o escolhido
desde início, mas por impossibilidade não pode aceitar o convite que seria
ainda endereçado a Donald O’Connor antes de chegar a vez de Danny Kaye.
O’Conner também se viu forçado a recusar o contrato, por razões de saúde (nessa
altura problemas com a coluna, não lhe permitam dançar, o que o filme exigia).
Quando chega a vez de Danny Kaye este não hesita, mas coloca condições draconianas:
exige desde logo 10% sobre os lucros da obra, mas igualmente a necessidade de
colocar dois novos argumentistas ao lado de Norman Krasna, precisamente os
homens de sua confiança, Norman Panamá e Melvin Frank.
A razão era fácil de perceber. Os
filmes onde Danny Kaye aparecia eram imaginados e escritos em função do actor e
das suas características fantasistas. “White Christmas” não era um filme com a
marca Danny Kaye e era necessário adaptá-lo ao actor, ainda que no final este
actor fique sempre secundarizado pela própria história. O facto dele ser um
soldado raso ao lado de um Bing Crosby capitão deve ter ajudado. A acompanhar
estas duas vedetas masculinas, dois nomes femininos sonantes na época, ainda
que por razões diversas: Vera-Ellen era uma das maiores bailarinas daquela
época e Rosemary Clooney uma das vozes mais apreciadas na década de 50 (o filme
é de 1954). O ramalhete estava composto, com um pouco de tudo, para todos os
gostos.
O argumento também fora
criteriosamente estudado para ser bem recebido pelo público a que se dirigia.
Estamos em meados da década de 50, os Estados Unidos tinham saído da II Guerra
Mundial há um década, durante a qual os veteranos do conflito tinham adquirido
ressonância épica e é sobre um desses homens que o filme fala. Durante os anos
do conflito na Europa, os americanos tinham-se distinguido, sobretudo depois do
desembarque na Normandia.
Algures numa dessas “frentes”, o
general Thomas F. Waverly (Dean Jagger) comanda um destacamento de que fazem
parte o capitão Bob Wallace (Bing Crosby), e o soldado Phil Davis (Danny Kaye).
Numa noite de Natal, antes de iniciarem mais uma ofensiva, comemoram a
efeméride debaixo de uma chuva de bombas inimigas. Anos depois, e conquistada a
paz, Bob Wallace, que é um célebre cançonetista, e Phil Davis, com quem passou
a constituir parelha, passeiam a sua fama pelos restaurantes, cabarets e
teatros norte-americanos, até que um dia, de novo perto da época do Natal, se
encontram ocasionalmente com uma outra dupla em busca de sucesso, as irmãs
Haynes, Betty (Rosemary Clooney) e Judy (Vera-Ellen).
Se já existia o glamour da
música, passa a aparecer agora o toque mágico do “romance”, a que se virá a
acrescentar ainda a exaltação patriótica, quando todos resolvem restaurar a
confiança perdida pelo general Thomas F. Waverly, que não se revela tão bom
director de hotel (numa estância de turismo de Inverno, onde falta a neve) como
o fora no campo de batalha. E assim se chega ao final apoteótico, onde, numa
noite de Natal, tudo se conjuga para a felicidade completa: dois casais de
cantores e bailarinos que assumem o seu amor, perante o olhar paternal de um
general de novo passando revista às suas fieis tropas, enquanto se vão ouvindo
os acordes de “White Christmas”, de Irving Berlin, e do céu começa a cair a
neve que reporá justiça nos cofres do hotel.
Filme mais natalício não há,
sobretudo em meados da década de 50. Com os EUA no rescaldo da II Guerra
Mundial e o Plano Marshal na Europa, esta é a imagem de felicidade que convém
fazer passar. Com o brilho de Inving Berling e a competência narrativa de um
mestre da eficácia, Michael Curtiz.
NATAL BRANCO
Título original:
White Christmas
Realização: Michael Curtiz (EUA, 1954); Argumento: Norman
Krasna, Norman Panama, Melvin Frank; Música: Gus Levene, Joseph J. Lilley,
Bernard Mayers, Van Cleave, Irving Berlin (canção "White Christmas");
Fotografia (cor): Loyal Griggs; Montagem: Frank Bracht; Direcção artística:
Roland Anderson, Hal Pereira; Decoração: Sam Comer, Grace Gregory;
Guarda-roupa: Edith Head; Maquilhagem: Wally Westmore; Assistentes de
realização: John R. Coonan; Departamento de arte: Dorothea Holt; Som: John
Cope, Hugo Grenzbach; Efeitos especiais: John P. Fulton; Produção: Robert
Emmett Dolan; Intérpretes: Bing
Crosby (Bob Wallace), Danny Kaye (Phil Davis), Rosemary Clooney (Betty Haynes),
Vera-Ellen (Judy Haynes), Dean Jagger (Gen. Thomas F. Waverly), Mary Wickes
(Emma Allen), John Brascia (Joe), Anne Whitfield (Susan Waverly), Bea Allen,
Joan Bayley, Tony Butala, Glen Cargyle, George Chakiris, Barrie Chase, Les
Clark, Lorraine Crawford, Robert Crosson, Marcel De la Brosse, Mike Donovan,
Ernie Flatt, Bess Flowers, Gavin Gordon, Johnny Grant, Percy Helton, I.
Stanford Jolley, Richard Keene, Vivian Mason, Peggy McKim, James Parnell, Sig
Ruman, Richard Shannon, Dick Stabile, Grady Sutton, Herb Vigran, etc. Duração: 120 minutos; Distribuição em Portugal
/DVD: Lusomundo Audiovisuais; Classificação etária: M/ 6 anos.
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