A
GRANDE PARÓDIA (1966)
Gérard Oury (1919-2006) é um curioso
realizador francês que começou a sua carreira como actor, depois passou a
realizador de filmes sobretudo policiais e de aventura, até se centrar na comédia,
em meados dos anos 60 do século XX, com excelentes resultados de bilheteira e
mesmo de crítica. “O Oportunista” (1965), “A Grande Paródia” (1966), “O Cérebro”
(1969), “A Mania das Grandezas” (1971) ou “As Aventuras do Rabi Jacob” (1973)
marcam o seu melhor período com “La Grande Vadrouille” a assumir destacado
lugar nas preferências do público francês: ainda hoje os 17 milhões de
espectadores na estreia, só foram ultrapassados por um outro título “Titanic”.
“Bienvenue chez les Ch'tis” (Bem Vindo ao Norte) bateu-o em receitas, mas não
em número de espectadores.
Casado com a belíssima actriz Michèle
Morgan (1960 - 2006), Gérard Oury teve uma formação clássica, foi actor na Comédie-Française,
mas foi a sua amizade e colaboração com actores como Bourvil, Louis de Funès ou
Jean-Paul Belmondo, com quem trabalhou particularmente que lhe trouxeram os
louros de que ainda hoje se pode orgulhar, dado que permanece um dos mais
vistos realizadores franceses de sempre. Quando “A Grande Paródia” passa num
qualquer canal de televisão francesa o sucesso é garantido.
Gérard Oury, que escreveu o argumento
desta comédia, em colaboração com Danièle Thompson, Marcel Jullian, Georges
Tabet e André Tabet, conheceu bem a época da Ocupação nazi em França, dadas as
suas origens judaicas, que o obrigou a fugir do país durante a primeira metade
da década de 40. É nesse período que se passa “La Grande Vadrouille”.
Durante um raide da britânica Royal Air
Force em céus franceses, três pilotos são obrigados a lançarem-se de paraquedas,
depois do avião onde seguiam ter sido atingido. Cada um vai para seu lado e
precisam desesperadamente do auxílio de franceses para escaparem aos nazis que
patrulham as avenidas e estradas. Um deles vai cair junto de um operário que
pinta a fachada de um prédio, Augustin Bouvet (Bourvil), o outro refugia-se
junto do maestro Stanislas Lefort (Louis de Funès), que ensaia um concerto na Ópera.
Claro que ambos os franceses, apesar de muito diferentes em muitos aspectos,
resolvem ajudar os ingleses e tentar colocá-los a salvo, fora das fronteiras
gaulesas ocupadas. A história de base é esta e será este esquema que permitirá
um conjunto de peripécias que irão despoletar uma torrente de gargalhadas e
sorrisos, sobretudo porque a direcção de Gérard Oury é fluente e elegante e as
interpretações de Louis de Funès, Bourvil e Terry-Thomas são excepcionais,
muito bem acompanhadas por todo o restante elenco.
Mas a reunião de actores como Louis de
Funès e Bourvil, quase sempre a intervirem em conjunto, mesmo numa determinada
sequência, um às cavalitas do outro, colocou alguns problemas ao realizador,
dada as características diversas dos dois intérpretes. Ao que consta Bourvil
era um adepto de vários ensaios antes de começar a rodar, e Louis de Funès,
pelo contrário, não ensaiava antes de filmar e ia aprimorando a representação à
medida que as takes que iam multiplicando. Um melhorava de cada vez que se
repetia a filmagem do plano, outro ia perdendo espontaneidade e justeza.
Como em quase todos os filmes, falando
apenas de cinema, onde aparecem duplas, a contradição é essencial. O gordo e o
magro, o alto e o baixo, aqui o modesto operário pachorrento e o artista
histérico e caprichoso. A definição das personagens funcionou brilhantemente, e
esta diferença de comportamentos é uma das razões do sucesso do filme, logo do
humor que lhe está subjacente.
Há sequências magníficas, desde o
encontro nuns banhos turcos, onde os ingleses ficaram de se reunir, até uma
outra passada numa pensão de província, onde os quartos dos franceses e dos
alemães se confundem por uma ocasional troca de números. Uma perseguição numa
carroça conduzida por uma jovem freira é outro momento hilariante, numa comédia
onde estes se sucedem num ritmo muito bem estudado e programado.
Louis de Funès foi um cómico dos mais
populares em todo o mundo, apesar de não ser unânime a apreciação do seu estilo
de humor. Para alguns é um dos génios da comédia, para outros os seus métodos
são relativamente fáceis e repetitivos. Mas “La Grande Vadrouille” é
indiscutivelmente um dos seus melhores trabalhos, onde mais controla o frenesim
da sua representação e alguns tiques que multiplica invariavelmente. De resto,
a presença do sólido Bourvil a seu lado muito contribui para o êxito desse
filme. Nalguns aspectos, aliás, relembra um outro, interpretado por ambos, e
por Jean Gabin, em 1956, “Ao Longo de Paris” (La Traversée de Paris), de Claude
Autant-Lara, onde Louis de Funès tinha ainda um papel secundário.
Rodado quase todo em cenários naturais,
exteriores e interiores (foi graças a André Malraux, Ministro da Cultura de
então, que se pode filmar no interior da Opéra Garnier), o filme conta ainda
com uma voluptuosa fotografia assinada por um mestre, Claude Renoir, filho do
actor Pierre Renoir, sobrinho do realizador Jean Renoir e neto do pintor
Pierre-Auguste Renoir.
A
GRANDE PARÓDIA
Título
original: La Grande Vadrouille
Realização: Gérard Oury
(França, Inglaterra, 1966); Argumento: Gérard Oury, Danièle Thompson, Marcel
Jullian, Georges Tabet, André Tabet; Produção: Robert Dorfmann; Música: Georges
Auric; Fotografia (cor): André Domage, Claude Renoir; Montagem: Albert
Jurgenson; Design de produção: Jean André, Théobald Meurisse; Guarda-roupa:
Tanine Autré, Léon Zay; Maquilhagem: Odette Berroyer, Pierre Berroyer; Direcção
de Produção: Pierre Saint-Blancat, Georges Vallon; Assistentes de realização:
Claude Clément, Lucile Costa, Gérard Guérin; Departamento de arte: Robert
André, Gabriel Béchir, Robert Christidès; Som: Antoine Bonfanti, Urbain
Loiseau; Efeitos especiais: Daniel Braunschwe, Claude Carliez, Gil Delamare,
Michel Durin, Pierre Durin, Jean Fouchet; Companhias de produção: Les Films
Corona, The Rank Organisation; Intérpretes:
Bourvil (Augustin Bouvet), Louis de Funès (Stanislas Lefort), Marie Dubois
(Juliette), Terry-Thomas (Sir Reginald), Claudio Brook (Peter Cunningham),
Andréa Parisy (Irmã Marie-Odile), Colette Brosset (Germaine), Mike Marshall
(Alan MacIntosh), Mary Marquet (Madre Superiora), Pierre Berti, Benno
Sterzenbach, Sieghardt Rupp, Reinhard Kolldehoff, Helmuth Schneider, Paul
Préboist, Hans Meyer, Guy Grosso, Michel Modo, Peter Jacob, Rudy Lenoir, Noël
Darzal, Pierre Roussel, Pierre Bastien, Jacques Sablon, Mag-Avril, Jacques
Bodoin, Gabriel Gobin, Paul Mercey, Henri Génès, etc. Duração: 132 minutos; Distribuição em Portugal: Castello Lopes
Multimédia; Classificação etária: M/ 12 anos.
LOUIS
DE FUNÈS (1914-1983)
Louis Germain de Funès de Galarza nasceu
a 31 de Julho de 1914, em Courbevoie, Hauts-de-Seine, França, e viria a falecer
a 27 de Janeiro de 1983, em Nantes, Loire-Atlantique, França, vítima de um
ataque de coração. O pai, Carlos Luis de Funès de Galarza, era advogado em
Sevilha, e a mãe, Leonor Soto Reguera, tinha origem galega e ascendência
portuguesa. Começou a aprender piano aos 5 anos. Estudou no Lycée Condorcet, em
Paris, e, depois de passar por diversas profissões, trabalhou num bar como
pianista. Olhos azuis, careca e de estatura baixa, nervoso e inquieto, de verbo
fácil e trapalhão, de mimica esfusiante, nada indicaria tornar-se numa
coqueluche de popularidade, alcançando o primeiro lugar nas preferências do
público francês por diversas vezes. Estuda teatro com Simon. Começou a carreira
no cinema em 1945, em “La Tentation de Barbizon”, de Jean Stelli, continuando a
entrar no elenco de dezenas de filmes de todos os géneros, até se impor como
protagonista e tornar-se mundialmente conhecido, a partir de 1964, ao
interpretar pela primeira vez o seu personagem mais famoso, um mal-humorado
gendarme. Mas os seus maiores êxitos estariam por vir, como “A Grande Paródia”
ou “As Loucas Aventuras do Rabbi Jacob”. Entre 1964 e 1979, esteve sempre em
lugar destacado no box-office de França, atingindo os 17,27 mihões de
espectadores com “A Grande Paródia”. Nos anos 50 foi ganhando popularidade, com
obras como “Ah ! les belles bacchantes” (1954), “La Traversée de Paris” (1956),
“Comme un cheveu sur la soupe” (1957) ou “Ni vu, ni connu” (1958), continuando
depois uma vasta filmografia donde se destacam inúmeros sucessos de público: “Pouic-Pouic”
(1963), “Le Gendarme de Saint-Tropez” (1964) e continuações, a trilogia “Fantômas”
(1964), “Le Corniaud” (1965), “La Grande Vadrouille” (1966), “Le Grand
Restaurant” (1966), “Oscar” (1967), “Les Grandes Vacances” (1967), “Le Petit
Baigneur” (1967), “Hibernatus” (1969), “Jo” (1971), “La Folie des Grandeurs”
(1971), “Les Aventures de Rabbi Jacob” (1973), “L'Aile ou la Cuisse” (1976), “La
Zizanie” (1977) e “La Soupe aux choux (1981). Escreveu vários argumentos e
co-realizou com Jean Girault, “L'Avare”, segundo Moliere, em 1980.
A 21 de Março de 1975, enquanto
representava no teatro “La Valse des Toréadors”, sente-se mal, e é-lhe diagnosticado
um enfarte de miocárdio. No hospital, pouco depois, recai com novo enfarte.
Permanece dois meses no hospital Necker, recupera, mas condiciona a partir daí
toda a sua actividade. Herda parte e compra a restante do castelo de Clermont,
onde passa a descansar nos intervalos de filmagens. Casado com Germaine Louise
Elodie Carroyer (1936 - 1942) e Jeanne De Funès (1943 - 1983), esta última
sobrinha de Guy de Maupassant.
Filmografia
essencial (de um total de 157 títulos) / como actor: 1945: La
Tentation de Barbizon, de Jean Stelli; 1947: Antoine et Antoinette (O Tonio e a
Toninhas), de Jacques Becker; 1951: La poison, de Sacha Guitry; 1952: Ils
étaient cinq, de Jack Pinoteau; Les Dents longue, de Daniel Gélin; 1953: La Vie
d'un honnête homme, de Sacha Guitry; 1954: Les Intrigantes, de Henri Decoin; 1955:
Napoléon (Napoleão), de Sacha Guitry; Si Paris nous était conté (Se Paris
falasse...), de Sacha Guitry; 1956: La Traversée de Paris (Ao Longo de Paris),
de Claude Autant-Lara; 1960: Le Capitaine Fracasse (O Capitão Sem Medo), de
Pierre Gaspard-Huit; Candide ou l'optimisme au XXe siècle, de Norbert
Carbonnaux; 1961: La Belle Américaine (A Bela Americana), de Robert Dhéry; 1964:
Le gendarme de Saint-Tropez (O Gendarme de Saint Tropez), de Jean Girault; Fantômas
(Fantomas), de André Hunebelle; 1965: Le Corniaud (O Oportunista), de Gérard
Oury; Le gendarme à New York (O Gendarme em Nova Iorque), de Jean Girault; Fantômas
se déchaîne (Fantomas Passa ao Ataque), de André Hunebelle; 1966: Le Grand
Restaurant (O Grande Restaurante), de Jacques Besnard; La Grande Vadrouille (A
Grande Paródia), de Gérard Oury; Fantômas contre Scotland Yard (Fantomas Contra
a Scotland Yard), de André Hunebelle; 1967: Les grandes vacances (As Férias
Grandes), de Jean Girault; Oscar (Onde está o Oscar?), de Édouard Molinaro;
1968: Le Petit Baigneur (O Pequeno Banhista), de Robert Dhéry; Le tatoué (Com a
Fortuna às Costas), de Denys de La Patellière; Le gendarme se marie (O Gendarme
Casa-se), de Jean Girault; 1969: Hibernatus (O Avozinho Congelado), de Édouard
Molinaro; 1970: L'homme orchestre (O Homem Orquestra), de Serge Korber; Le
gendarme en balade (O Gendarme em Férias, de Jean Girault; 1971: Sur un arbre
perche (Numa Árvore Empoleirado), de Serge Korber; Jo (Um Buraco no Coreto), de
Jean Girault; La folie des grandeurs (A Mania das Grandezas), de Gérard Oury;
1973: Les aventures de Rabbi Jacob (As Aventuras do Rabi Jacob), de Gérard
Oury; 1976: L'aile ou la cuisse (O Peito ou a Perna), de Claude Zidi; 1978: La
Zizanie (O Incorrigível Teimoso), de Daubray-Lacaze;1979: Le gendarme et les
extra-terrestres (O Gendarme e os Extraterrestres), de Jean Girault; 1980:
L'avare (O Avarento), de Louis de Funès e Jean Girault; 1981: La Soupe aux
choux, de Jean Girault; 1982: Le gendarme et les gendarmettes (O Gendarme e as
Gendarmetas), de Ludovic Cruchot.
Como
realizador:
1980 O Avarento (juntamente com Jean Girault).
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