segunda-feira, 21 de março de 2016

SESSÃO 10 - 5 DE ABRIL DE 2016


A GRANDE PARÓDIA (1966)

Gérard Oury (1919-2006) é um curioso realizador francês que começou a sua carreira como actor, depois passou a realizador de filmes sobretudo policiais e de aventura, até se centrar na comédia, em meados dos anos 60 do século XX, com excelentes resultados de bilheteira e mesmo de crítica. “O Oportunista” (1965), “A Grande Paródia” (1966), “O Cérebro” (1969), “A Mania das Grandezas” (1971) ou “As Aventuras do Rabi Jacob” (1973) marcam o seu melhor período com “La Grande Vadrouille” a assumir destacado lugar nas preferências do público francês: ainda hoje os 17 milhões de espectadores na estreia, só foram ultrapassados por um outro título “Titanic”. “Bienvenue chez les Ch'tis” (Bem Vindo ao Norte) bateu-o em receitas, mas não em número de espectadores.
Casado com a belíssima actriz Michèle Morgan (1960 - 2006), Gérard Oury teve uma formação clássica, foi actor na Comédie-Française, mas foi a sua amizade e colaboração com actores como Bourvil, Louis de Funès ou Jean-Paul Belmondo, com quem trabalhou particularmente que lhe trouxeram os louros de que ainda hoje se pode orgulhar, dado que permanece um dos mais vistos realizadores franceses de sempre. Quando “A Grande Paródia” passa num qualquer canal de televisão francesa o sucesso é garantido.
Gérard Oury, que escreveu o argumento desta comédia, em colaboração com Danièle Thompson, Marcel Jullian, Georges Tabet e André Tabet, conheceu bem a época da Ocupação nazi em França, dadas as suas origens judaicas, que o obrigou a fugir do país durante a primeira metade da década de 40. É nesse período que se passa “La Grande Vadrouille”.

Durante um raide da britânica Royal Air Force em céus franceses, três pilotos são obrigados a lançarem-se de paraquedas, depois do avião onde seguiam ter sido atingido. Cada um vai para seu lado e precisam desesperadamente do auxílio de franceses para escaparem aos nazis que patrulham as avenidas e estradas. Um deles vai cair junto de um operário que pinta a fachada de um prédio, Augustin Bouvet (Bourvil), o outro refugia-se junto do maestro Stanislas Lefort (Louis de Funès), que ensaia um concerto na Ópera. Claro que ambos os franceses, apesar de muito diferentes em muitos aspectos, resolvem ajudar os ingleses e tentar colocá-los a salvo, fora das fronteiras gaulesas ocupadas. A história de base é esta e será este esquema que permitirá um conjunto de peripécias que irão despoletar uma torrente de gargalhadas e sorrisos, sobretudo porque a direcção de Gérard Oury é fluente e elegante e as interpretações de Louis de Funès, Bourvil e Terry-Thomas são excepcionais, muito bem acompanhadas por todo o restante elenco.
Mas a reunião de actores como Louis de Funès e Bourvil, quase sempre a intervirem em conjunto, mesmo numa determinada sequência, um às cavalitas do outro, colocou alguns problemas ao realizador, dada as características diversas dos dois intérpretes. Ao que consta Bourvil era um adepto de vários ensaios antes de começar a rodar, e Louis de Funès, pelo contrário, não ensaiava antes de filmar e ia aprimorando a representação à medida que as takes que iam multiplicando. Um melhorava de cada vez que se repetia a filmagem do plano, outro ia perdendo espontaneidade e justeza.
Como em quase todos os filmes, falando apenas de cinema, onde aparecem duplas, a contradição é essencial. O gordo e o magro, o alto e o baixo, aqui o modesto operário pachorrento e o artista histérico e caprichoso. A definição das personagens funcionou brilhantemente, e esta diferença de comportamentos é uma das razões do sucesso do filme, logo do humor que lhe está subjacente.


Há sequências magníficas, desde o encontro nuns banhos turcos, onde os ingleses ficaram de se reunir, até uma outra passada numa pensão de província, onde os quartos dos franceses e dos alemães se confundem por uma ocasional troca de números. Uma perseguição numa carroça conduzida por uma jovem freira é outro momento hilariante, numa comédia onde estes se sucedem num ritmo muito bem estudado e programado. 
Louis de Funès foi um cómico dos mais populares em todo o mundo, apesar de não ser unânime a apreciação do seu estilo de humor. Para alguns é um dos génios da comédia, para outros os seus métodos são relativamente fáceis e repetitivos. Mas “La Grande Vadrouille” é indiscutivelmente um dos seus melhores trabalhos, onde mais controla o frenesim da sua representação e alguns tiques que multiplica invariavelmente. De resto, a presença do sólido Bourvil a seu lado muito contribui para o êxito desse filme. Nalguns aspectos, aliás, relembra um outro, interpretado por ambos, e por Jean Gabin, em 1956, “Ao Longo de Paris” (La Traversée de Paris), de Claude Autant-Lara, onde Louis de Funès tinha ainda um papel secundário.
Rodado quase todo em cenários naturais, exteriores e interiores (foi graças a André Malraux, Ministro da Cultura de então, que se pode filmar no interior da Opéra Garnier), o filme conta ainda com uma voluptuosa fotografia assinada por um mestre, Claude Renoir, filho do actor Pierre Renoir, sobrinho do realizador Jean Renoir e neto do pintor Pierre-Auguste Renoir.

A GRANDE PARÓDIA
Título original: La Grande Vadrouille
Realização: Gérard Oury (França, Inglaterra, 1966); Argumento: Gérard Oury, Danièle Thompson, Marcel Jullian, Georges Tabet, André Tabet; Produção: Robert Dorfmann; Música: Georges Auric; Fotografia (cor): André Domage, Claude Renoir; Montagem: Albert Jurgenson; Design de produção: Jean André, Théobald Meurisse; Guarda-roupa: Tanine Autré, Léon Zay; Maquilhagem: Odette Berroyer, Pierre Berroyer; Direcção de Produção: Pierre Saint-Blancat, Georges Vallon; Assistentes de realização: Claude Clément, Lucile Costa, Gérard Guérin; Departamento de arte: Robert André, Gabriel Béchir, Robert Christidès; Som: Antoine Bonfanti, Urbain Loiseau; Efeitos especiais: Daniel Braunschwe, Claude Carliez, Gil Delamare, Michel Durin, Pierre Durin, Jean Fouchet; Companhias de produção: Les Films Corona, The Rank Organisation; Intérpretes: Bourvil (Augustin Bouvet), Louis de Funès (Stanislas Lefort), Marie Dubois (Juliette), Terry-Thomas (Sir Reginald), Claudio Brook (Peter Cunningham), Andréa Parisy (Irmã Marie-Odile), Colette Brosset (Germaine), Mike Marshall (Alan MacIntosh), Mary Marquet (Madre Superiora), Pierre Berti, Benno Sterzenbach, Sieghardt Rupp, Reinhard Kolldehoff, Helmuth Schneider, Paul Préboist, Hans Meyer, Guy Grosso, Michel Modo, Peter Jacob, Rudy Lenoir, Noël Darzal, Pierre Roussel, Pierre Bastien, Jacques Sablon, Mag-Avril, Jacques Bodoin, Gabriel Gobin, Paul Mercey, Henri Génès, etc. Duração: 132 minutos; Distribuição em Portugal: Castello Lopes Multimédia; Classificação etária: M/ 12 anos.


LOUIS DE FUNÈS (1914-1983)
Louis Germain de Funès de Galarza nasceu a 31 de Julho de 1914, em Courbevoie, Hauts-de-Seine, França, e viria a falecer a 27 de Janeiro de 1983, em Nantes, Loire-Atlantique, França, vítima de um ataque de coração. O pai, Carlos Luis de Funès de Galarza, era advogado em Sevilha, e a mãe, Leonor Soto Reguera, tinha origem galega e ascendência portuguesa. Começou a aprender piano aos 5 anos. Estudou no Lycée Condorcet, em Paris, e, depois de passar por diversas profissões, trabalhou num bar como pianista. Olhos azuis, careca e de estatura baixa, nervoso e inquieto, de verbo fácil e trapalhão, de mimica esfusiante, nada indicaria tornar-se numa coqueluche de popularidade, alcançando o primeiro lugar nas preferências do público francês por diversas vezes. Estuda teatro com Simon. Começou a carreira no cinema em 1945, em “La Tentation de Barbizon”, de Jean Stelli, continuando a entrar no elenco de dezenas de filmes de todos os géneros, até se impor como protagonista e tornar-se mundialmente conhecido, a partir de 1964, ao interpretar pela primeira vez o seu personagem mais famoso, um mal-humorado gendarme. Mas os seus maiores êxitos estariam por vir, como “A Grande Paródia” ou “As Loucas Aventuras do Rabbi Jacob”. Entre 1964 e 1979, esteve sempre em lugar destacado no box-office de França, atingindo os 17,27 mihões de espectadores com “A Grande Paródia”. Nos anos 50 foi ganhando popularidade, com obras como “Ah ! les belles bacchantes” (1954), “La Traversée de Paris” (1956), “Comme un cheveu sur la soupe” (1957) ou “Ni vu, ni connu” (1958), continuando depois uma vasta filmografia donde se destacam inúmeros sucessos de público: “Pouic-Pouic” (1963), “Le Gendarme de Saint-Tropez” (1964) e continuações, a trilogia “Fantômas” (1964), “Le Corniaud” (1965), “La Grande Vadrouille” (1966), “Le Grand Restaurant” (1966), “Oscar” (1967), “Les Grandes Vacances” (1967), “Le Petit Baigneur” (1967), “Hibernatus” (1969), “Jo” (1971), “La Folie des Grandeurs” (1971), “Les Aventures de Rabbi Jacob” (1973), “L'Aile ou la Cuisse” (1976), “La Zizanie” (1977) e “La Soupe aux choux (1981). Escreveu vários argumentos e co-realizou com Jean Girault, “L'Avare”, segundo Moliere, em 1980.
A 21 de Março de 1975, enquanto representava no teatro “La Valse des Toréadors”, sente-se mal, e é-lhe diagnosticado um enfarte de miocárdio. No hospital, pouco depois, recai com novo enfarte. Permanece dois meses no hospital Necker, recupera, mas condiciona a partir daí toda a sua actividade. Herda parte e compra a restante do castelo de Clermont, onde passa a descansar nos intervalos de filmagens. Casado com Germaine Louise Elodie Carroyer (1936 - 1942) e Jeanne De Funès (1943 - 1983), esta última sobrinha de Guy de Maupassant.

Filmografia essencial (de um total de 157 títulos) / como actor: 1945: La Tentation de Barbizon, de Jean Stelli; 1947: Antoine et Antoinette (O Tonio e a Toninhas), de Jacques Becker; 1951: La poison, de Sacha Guitry; 1952: Ils étaient cinq, de Jack Pinoteau; Les Dents longue, de Daniel Gélin; 1953: La Vie d'un honnête homme, de Sacha Guitry; 1954: Les Intrigantes, de Henri Decoin; 1955: Napoléon (Napoleão), de Sacha Guitry; Si Paris nous était conté (Se Paris falasse...), de Sacha Guitry; 1956: La Traversée de Paris (Ao Longo de Paris), de Claude Autant-Lara; 1960: Le Capitaine Fracasse (O Capitão Sem Medo), de Pierre Gaspard-Huit; Candide ou l'optimisme au XXe siècle, de Norbert Carbonnaux; 1961: La Belle Américaine (A Bela Americana), de Robert Dhéry; 1964: Le gendarme de Saint-Tropez (O Gendarme de Saint Tropez), de Jean Girault; Fantômas (Fantomas), de André Hunebelle; 1965: Le Corniaud (O Oportunista), de Gérard Oury; Le gendarme à New York (O Gendarme em Nova Iorque), de Jean Girault; Fantômas se déchaîne (Fantomas Passa ao Ataque), de André Hunebelle; 1966: Le Grand Restaurant (O Grande Restaurante), de Jacques Besnard; La Grande Vadrouille (A Grande Paródia), de Gérard Oury; Fantômas contre Scotland Yard (Fantomas Contra a Scotland Yard), de André Hunebelle; 1967: Les grandes vacances (As Férias Grandes), de Jean Girault; Oscar (Onde está o Oscar?), de Édouard Molinaro; 1968: Le Petit Baigneur (O Pequeno Banhista), de Robert Dhéry; Le tatoué (Com a Fortuna às Costas), de Denys de La Patellière; Le gendarme se marie (O Gendarme Casa-se), de Jean Girault; 1969: Hibernatus (O Avozinho Congelado), de Édouard Molinaro; 1970: L'homme orchestre (O Homem Orquestra), de Serge Korber; Le gendarme en balade (O Gendarme em Férias, de Jean Girault; 1971: Sur un arbre perche (Numa Árvore Empoleirado), de Serge Korber; Jo (Um Buraco no Coreto), de Jean Girault; La folie des grandeurs (A Mania das Grandezas), de Gérard Oury; 1973: Les aventures de Rabbi Jacob (As Aventuras do Rabi Jacob), de Gérard Oury; 1976: L'aile ou la cuisse (O Peito ou a Perna), de Claude Zidi; 1978: La Zizanie (O Incorrigível Teimoso), de Daubray-Lacaze;1979: Le gendarme et les extra-terrestres (O Gendarme e os Extraterrestres), de Jean Girault; 1980: L'avare (O Avarento), de Louis de Funès e Jean Girault; 1981: La Soupe aux choux, de Jean Girault; 1982: Le gendarme et les gendarmettes (O Gendarme e as Gendarmetas), de Ludovic Cruchot.

Como realizador: 1980 O Avarento (juntamente com Jean Girault). 

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